Bismillah Arahmani Rahim - Assalamu Aleikom wa Ramatulahi wa Baraketuhu
Por: Dr. Abdulrahman Ráafat Bacha
Tradução: Prof. Samir El Hayek
Ele aprendeu e transmitiu mais de mil e seiscentos ahadice do Profeta (SAAS), e os pôs a serviço da comunidade muçulmana.
Sem dúvida, o leitor já ouviu falar dessa brilhante estrela dos círculos de pessoas que constituíam os companheiros do Mensageiro de Allah (S). Não há um muçulmano vivo que não tenha ouvido falar dele.
Seu nome, antes de tornar-se muçulmano, era Abd Shams, que significa “servo do sol”. Quando Allah o honorificou com a crença no Islam, e ele teve o privilégio de se encontrar com o Profeta (S), este perguntou:
“Como é o teu nome?”
“Abd Shams”, ele respondeu.
“De agora em diante, ele irá ser Abd al Rahman (servo do Misericordiosíssimo)”, disse o Profeta (SAAS).
“Sim, Abd al Rahman”, concordou o Abu Huraira, “pois eis que te trocaria pelo meu pai e pela minha mãe, ó Mensageiro de Allah (S) !”
O fato de como ele veio a ser conhecido como Abu Huraira é uma outra história. Quando era criança, costumava ter sempre um gatinho, que levava consigo a toda parte, e com o qual brincava, tanto que os seus amiguinhos o apelidaram de Abu Huraira (pai do gatinho). Quando o destino de Abu Huraira tornou-se ligado à comunidade islâmica, o Profeta (SAAS) com freqüência o chamava de “Abu Hirr” (pai do gato), por carinho familiar e afeição a ele. O próprio Abu Huraira começou a preferir o seu segundo apelido, e dizia:
“É o nome com que o meu querido Profeta (S) costumava chamar-me. Ademais, ‘Huraira’ tem um cunho feminino e pequeno, e eu sou homem.”
Abu Huraira foi convertido ao Islam por intermédio de Al Tufayl b. Amr al Dawsi (Para a biografia de Al Tufayl, ver a Parte Um destas séries), e permaneceu nas terras da tribo deste, os Daws, até seis anos depois da Hégira. Nesse tempo, ele foi com gentes do seu povo, numa delegação, visitar o Mensageiro de Allah (S).
Uma vez assentado em Madina, o jovem Abu Huraira se dedicou a servir ao Profeta (SAAS), e a passar todo o seu tempo aprendendo com ele. Fez da mesquita a sua casa, e tinha o Profeta (SAAS) na conta de ser o seu professor e guia espiritual. Enquanto o Profeta (SAAS) permaneceu vivo, o Abu Huraira não se casou nem constituiu família. O único parente que tinha era a sua idosa mãe, que insistia em permanecer pagã. Abu Huraira constantemente a incitava a tornar-se muçulmana, pois que desejava o melhor para ela, e temia que a idolatria fosse ser a causa da sua ruína na Vida Futura. Ela sempre rejeitava a sugestão, e saía de perto dele, zangada. Não querendo apoquentá-la mais, ele ia embora cheio de tristeza.
Após uma daquelas cenas, em que ela disse algo cruel e desrespeitoso acerca do Profeta (SAAS), o Abu Huraira foi embora em lágrimas, e procurou o Profeta (SAAS), que lhe perguntou:
“Que te fez chorar, ó Abu Huraira?”
“Eu nunca vacilei nos meus esforços de chamar minha mãe para o Islam, embora ela sempre resistisse. Hoje eu tentei novamente convencê-la, e ela disse coisas odiosas sobre ti. Reza para que o Todo-Poderoso Allah incline favoravelmente o coração dela para o Islam!” Então o Profeta (S) fez uma oração por ela.
O próprio Abu Huraira mais tarde relatou o que se seguiu:
“Fui para casa, e constatei que a porta estava fechada. Ouvi ruídos de água sendo esparrinhada, e estava a ponto de entrar, quando minha mãe gritou:
“‘Fica onde estás, ó Abu Huraira!’
“Ela se vestiu, e disse:
“‘Agora podes entrar.’
“Entrei, e ela declarou:
“‘Presto testemunho de que não há outra divindade além de Allah, e que Mohammad (S) é o Seu servo e Mensageiro!’
“Voltei para o Profeta (S), derramando lágrimas de alegria – sendo que apenas uma hora antes havia derramado lágrimas de tristeza –, e disse:
“‘Ouve esta boa notícia, ó Mensageiro de Allah (S)! O Senhor ouviu a tua oração e guiou a mãe de Abu Huraira para o Islam!’”
O amor que o Abu Huraira nutria pelo Mensageiro de Allah (S) era tão profundo, que se tornou parte das próprias fibras do seu ser. Nunca se cansava de olhar para ele, e dizia acerca dele:
“Jamais vi nada mais belo ou mais pleno de luz do que o Profeta (S). É como se os raios de sol se soltassem do seu rosto!”
Abu Huraira constantemente louvava a Allah e dava graças a Ele por Este ter-lhe concedido o privilégio de passar horas e horas com o Seu Profeta (S), e seguir a Sua religião. Ele dizia mais:
“Louvado seja Allah Que guiou o Abu Huraira para o Islam! Louvado seja Allah Que ensinou ao Abu Huraira o Alcorão! Louvado seja Allah Que concedeu ao Abu Huraira a companhia de Mohammad (S)!”
Do mesmo modo com que o Abu Huraira se tornou apegado ao Profeta (S), tornou-se também comissionado com o aprendizado. Este tornou-se o seu interesse intrínseco, coisa que estava acima de tudo o que ele desejava deste mundo.
O Zaid b. Sábit(Para a biografia de Zaid b. Sábit, ver o Capítulo 7 deste volume) relatou, numa ocasião:
“O Abu Huraira, um outro amigo, e eu, estávamos na mesquita tecendo louvores a Allah e fazendo-Lhe súplicas, quando o Mensageiro de Allah (S) entrou. Chegou-se para perto de nós, sentou-se, e disse:
“‘Não deixeis que eu vos interrompa!’
“Então, meu amigo e eu continuamos a fazer súplicas, ao que o Profeta (S) dizia ‘Amém!’
“Então foi a vez do Abu Huraira, e ele disse:
“‘Ó Allha, peço-Te tudo aquilo que meus companheiros Te pediram, e peço-Te que me dês conhecimentos que eu jamais venha esquecer!’ ao que o Profeta (S) disse ‘Amém!’ Então nós outros dissemos:
“‘Nós também queremos pedir-Te que nos dês conhecimentos que jamais venhamos esquecer!’
“Tarde demais’, disse o Profeta (S); ‘vosso jovem amigo, dos Daws, antecipou-se a vós nisso.”
Abu Huraira não apenas amava o aprendizado para si mesmo, mas ainda gostava que outras pessoas adquirissem conhecimentos. Um dia ele estava passando pela praça do mercado, em Madina, e ficou admirado de quanto materialista todo mundo se havia tornado, e de como a única preocupação deles era a barganha, a compra, e a venda. Ele se postou à frente de todos, e anunciou:
“Quão incompetentes vos tornastes, ó povo de Madina!”
“Por que achas que somos incompetentes?” perguntaram.
“O legado do Mensageiro de Allah (S) está sendo dividido e distribuído, e vós estais aqui! Por que não ides reivindicar o vosso quinhão?” ele perguntou.
“Onde, ó Abu Huraira?” perguntaram.
“Na mesquita”, foi a resposta dele. Então todos correram, enquanto o Abu Huraira ficou onde estava, até que eles voltaram, e disseram:
“Ó Abu Huraira, nós fomos até à mesquita, entramos, e não vimos nada sendo distribuído!”
“Será que não vistes ninguém na mesquita?” ele inquiriu.
“Sim, vimos umas pessoas”, responderam. “Algumas estavam fazendo orações, e outras estavam estudando a lei religiosa.”
“Oh, quão tolos sois!” ele exclamou. “Pois esse é o legado do Mensageiro de Allah (S).”
Abu Huraira passou severas provações por causa da escolaridade e da freqüência às assembléias mantidas pelo Mensageiro de Allah (S). Ele contou muitas estórias do que suportou, e mencionou que ficava tão ávido de conhecimento, que chegava a perguntar a outros Companheiros algo sobre o Alcorão, embora ele próprio estivesse melhor informado. Ele fazia isso, na esperança de que fosse convidado a entrar na casa do interlocutor, e lhe fosse oferecido algo para comer.
Um dia, ele ficou tão faminto, que chegou a amarrar uma pedra chata ao estômago para aliviar a dor. Sentou-se a esperar, no caminho que era usualmente tomado pelos Companheiros, e aconteceu passar por ali o Abu Bakr. O Companheiro em questão perguntou-lhe acerca de certo versículo do Alcorão, mas apenas na esperança de que fosse ser convidado à casa do Abu Bakr, mas isso não aconteceu.
Um pouco mais terde, passou o Ômar. Novamente o Abu Huraira inquiriu sobre um versículo do Alcorão. Mais uma vez ele ficou desapontado. Então o Profeta (S) apareceu, e exclamou:
“Ó Abu Huraira!”
“Estou ao teu serviço, ó Mensageiro de Allah (S)!” ele respondeu, e seguiu o Profeta (S), que o levou para a própria casa. O Profeta (S) encontrou um cântaro de leite, e perguntou para a sua esposa de onde aquilo havia vindo. Ela respondeu que alguém tinha enviado para ele, então ele disse:
“Ó Abu Huraira,vai até às pessoas que moram na mesquita, e convida-as para virem aqui!” Pobre do Abu Huraira! Ele desejava, do fundo do seu coração, que lhe fosse oferecido um pouco de leite, antes que saísse para chamar as pessoas da mesquita. Mas ele saiu obedientemente, imaginando:
“Como pode ser, um cântaro de leite para todas aquela pessoas?”
Abu Huraira levou as pessoas para a casa do Profeta (S), e todos se sentaram. Então o Profeta (S) disse:
“Ó Abu Huraira, pega o cântaro e dá-lhes de beber!” Abu Huraira deu-o ao primeiro homem, que bebeu a se fartar. Um após outro, todos eles beberam o quanto puderam. Então o Abu Huraira entregou-o para o Mensageiro de Allah (S) que o olhou sorridentemente, e disse:
“Só restamos nós dois.”
“E verdade, ó Mensageiro de Allah (S).”
“Bebe primeiro”, disse o Profeta (S), e o Abu Huraira bebeu. O Profeta (S) o incitou a meber mais e mais, até que o Abu Huraira disse:
“Juro por Aquele Que te enviou com a verdade, que estou cheio, e não posso beber mais.” Então o Profeta (S) pegou o cântaro e terminou o restante do leite.
Aquilo foi um curto período de tempo, antes que a riqueza começasse a fluir para a comunidade muçulmana. A expansão do Estado Islâmico trazia incontáveis riquezas para o tesouro. Abu Huraira por fim passou possuir uma pequena propriedade, um lar e mobiliário. Casou-se e constituíu família. Todas aquelas mudanças não alteraram o seu caráter virtuoso, e jmais se esqueceu do seu passado. Costumava dizer:
“Fui criado sem pai. Empreendi a Hégira como pobre, e realizei trabalho braçal para a Busra bint Ghazwan em troca da minha ração diária. Servi de criado para os viajantes quando faziam uma parada para descanso, e lhes levava de volta as montarias quando reiniciavam a viagem. Allah me destinou casar-me com aquela senhora. Louvado seja Allah Que tornou a religião um modo de vida, e fez de mim um líder.”
Abu Huraira foi feito governador de Madina pelo Muawiya b. Abi Sufyan, mais de uma vez. Nem mesmo aquela posição de autoridade alterou a doce disposição e a virtude de Abu Huraira. Uma vez ele estava indo por uma estreita alameda, em Madina, carregando nas costas um feixe de lenha para queimar, para a sua família(Aqui, não devemos pensar num feixe de lenha bem cortada, por igual, mas num braçado de gravetos, que eram o único combustível disponível naquele tempo). Ia passar pelo Salaba b. Málik, para o qual disse:
“Dá caminho para o príncipe, ó filho de Málik!”
“Que Allah tenha misericórdia de ti!” exclamou o Ibn Málik. “Será que o caminho não é suficientemente largo?”
“Dá caminho para o príncipe”, respondeu Abu Huraira, “e para o feixe que está carregando nas suas costa!”
Em acréscimo à sua erudição e personalidade agradável, o Abu Huraira era uma pessoa religiosa e temente a Allah. Era capaz de passar muitos dias em jejum voluntário, e muitas noites em vigília oracional. Orava num terço da noite, depois acordava a sua esposa, entes de ir dormir. Ele então orava por outro terço da noite, antes de acordar a sua filha, que terminava a noite em oração. Daquela maneira, a oração era mantida pela noite adentro, na casa do Abu Huraira.
Abu Huraira tinha um escrava africana, uma garota que uma vez o insultou, e que a sua esposa aborrecia. Ele pegou uma vara e levantou a mão para bater nela com aquilo, mas reconsiderou, dizendo:
“Não fosse pelo fato de que irá haver castigo, no Dia do Julgamento, iria ferir-te do mesmo modo que me injuriaste. Ao invés, eu te venderei para Alguém Que me irá dar o teu valor em toda a medida – e eu preciso disso. Vai, pois estás livre, por amor a Allah.”
Sua filha costumava dizer-lhe:
“Pai, as garotas gozam de mim, dizendo: ‘Por que teu pai não pensa mais um pouco em ti, dando-te alguma jóia de ouro?’”
Abu Huraira respondeu:
“Dize-lhes que teu pai teme que sofras o Fogo, por causa da vaidade e da arrogância.”
Em verdade, não era por mesquinhez que o Abu Huraira não adornava a sua filha, pois que era generoso quando se tratava de abrir a mão pela causa de Allah.
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